domingo, 25 de abril de 2010

Tambem estive na fronteira norte de Angola

Extrato de " A minha odisseia por terras Angolanas", onde caracterizo a região fronteiriça Norte, junto da qual terminei a longa comissão de mais de 2 anos, Já depois de 25 de Abril de 1974.
Esta região fronteiriça do norte de Angola, apresentava um relevo bastante ondulado com altos capinzais, diversas espinhosas e alguns pântanos repletos dos incomodáveis mosquitos em espacial na época das chuvas. Também se encontravam principalmente nos vales e junto das linhas de água algumas florestas virgens cerradas, mas que não impossibilitavam a sua penetração.
O clima de características tropicais era muito adverso para a saúde de todos nós, e propício ao aparecimento de doenças como o paludismo e as hepatites. Registavam-se duas estações, a das chuvas de meados de Outubro a meados de Maio que se caracterizava por altas temperaturas, humidade elevada e, enormes índices de pluviosidade que dificultavam enormemente o transito de viaturas pelas picadas de terreno argiloso de cor avermelhada muito escorregadio característico desta região.
A estação seca ou do cacimbo de meados de Maio a meados de Outubro caracterizava-se pela ausência de chuvas, descida de temperatura e formação durante a noite de um tipo de nevoeiro que designávamos por cacimbo, o qual se prolongava até meio da manha com condições de visibilidade muito reduzidas, condicionando fortemente as deslocações das aeronaves com consequências muito nefastas nas evacuações aéreas de doentes e feridos.
Esta zona que antes do eclodir da guerra em 1961 tinha uma relativamente grande densidade populacional, encontrava-se agora praticamente desabitada, os aglomerados populacionais indígenas tinham sido abandonadas no seguimento desses acontecimentos, tendo os seus habitantes pertencentes ao grupo étnico kicongo, refugiado-se nas matas ou foragido para a vizinha Republica do Zaire.
Os indivíduos que se apresentavam ou eram resgatados da mata pelas N.T ( nossas tropas). foram no seguimento de directrizes governamentais e para melhor controle militar, reordenados em povoações ao longo dos principais itinerários, ou nos centros populacionais existentes, como São Salvador a capital do distrito, distante de nós cerca de 80 km, que além da guarnição militar e de alguns comerciantes e funcionários brancos, possuía uma sanzala habitada por várias centenas de africanos.
Na Mamarrosa base militar onde agora me encontrava existia uma roça de café, a única da região que tinha sobrevivido ao eclodir da guerra, era protegida pelas N.T. e empregava cerca de 100 trabalhadores Bailundos, oriundos do centro de Angola e aqui a laborar como contratados.
Esta era uma zona de influência da (FNLA) Frente Nacional de Libertação de Angola, presidida por Holden Roberto, que possuía os seus santuários logo alí na vizinha Republica do Zaire. Ao contrário da região dos Dembos, onde iniciei a minha longa comissão de mais de dois anos, aqui o IN (inimigo) não se encontrava radicado com carácter de permanência, apenas a utilizando como área de trânsito, reabastecimento e recolha de informações. Era um dos principais corredores de penetração utilizados para infiltrar grupos armados para essa zona fulcral da guerra que era a mata dos Dembos-Nambuangongo, Zala – e na rota em sentido inverso para fazer entrar na Republica do Zaire populações retiradas dessas matas do interior, ou guerrilheiros para recuperação, treino e rearmamento para posterior reentrada em Angola.
Estas colunas IN durante os seus movimentos lançavam a grande distância batedores avançados que mantinham informados o grosso da coluna. De igual modo utilizavam guardas para protegerem a retaguarda.
Aqui o IN procurava esquivar-se ao contacto com as NT, evitando deixar vestígios da sua passagem ou permanência e quando detectado reagia pelo fogo, mas sempre procurando pôr-se em fuga.
Também espiavam os nossos movimentos e actividades e esporadicamente actuavam através das suas temíveis Companhias Moveis, as quais se revelavam muito destemidas, violentas e bem organizadas, assim como aquela chefiada pelo temível Pedro Afamado.
Por terem logo do outro lado da fronteira as suas importantes bases de Sangololo e Kinkuso, tornava-se muito tentador o ataque relâmpago aos aquartelamentos de fronteira seguido de fuga para esses santuarios, como aquele ao nosso pequeno destacamento do Luvo, como descrevo em: "O meu 29 de julho" que pode ser lido clicando AQUI 
Manuel Aldeias

domingo, 18 de abril de 2010

16º ANIVERSÁRIO DA APOIAR

A APOIAR (Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vitimas do Stess de Guerra), realizou no domingo dia 18 de Abril um convívio no pavilhão do Liberdade Futebol Clube, em lisboa, para comemorar o seu 16º aniversário.
Assistiram a este evento além de vários sócios e familiares, diversas entidades convidadas entre as quais a Drª Felicidade Bapista em representação do Secretario de Estado da Defesa e Assuntos do Mar, o Presidente da Comissão Nacional de Apoio aos Ex-Combatentes general Aníbal Flambó, o Dr. Ricardo Almeida em representação da C.M. de Lisboa e representantes de alguns partidos políticos.
O presidente da direcção Dr. Armindo Roque iniciou a sessão de boas vindas saudando e agradecendo a presença de todos, começando por denunciar o estado de abandono a que foram vetados os ex-militares das incorporações locais de Angola, Moçambique e Guiné, que lutaram incorporados no exercito português. Muitos destes militares foram assassinados e enterrados em valas comuns nos anos a seguir a 25 de Abril de 1974. Armindo Roque chamou ao pálco Iaia Jamanca um antigo fuzileiro Guineense que ao cabo de vários anos refugiado na selva, conseguiu alcançar Portugal onde encontrou refugio.
No seguimento da palavra o Dr. Afonso de Albuquerque na qualidade de presidente da assembleia-geral, enalteceu o meritório trabalho da Apoiar em prol dos ex-combatentes e mostrou-se disponível para prosseguir com o seu apoio a esta causa.
A jovem e promissora cantora Francisca Nouronha animou com as suas melodiosas interpretações este salutar convívio, que decorreu num clima de franca e alegre convivência entre sócios e convidados.
Seguiu-se um repasto com mesas fartas de diversas doçarias e variados petiscos, tudo confeccionado palas prestimosas esposas dos sócios, onde também não faltou um bonito e delicioso bolo de aniversario.
Manuel Aldeias

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Recordando o convivio de 2007

Agora que se aproxima a passos largos o 2º convívio da C.CAÇ. 3386 “Os Carolas Unidos”, que terá lugar a 8 de Maio, não posso deixar de recordar o 1º convívio, organizado conjuntamente com os "Escorpiões" da C.CAÇ. 3387 que teve lugar na maravilhosa cidade de Aveiro no ano de 2007.
Quando após passados 34 anos nos foi dada a enorme alegria de reencontrar-mos alguns dos nossos antigos camaradas, a comoção foi enorme, o coração bateu apressado e, algumas lágrimas traiçoeiras marejaram os olhos destes ex-rapazes soldados, agora a entrarem no Outono da vida.
Aqueles tempos de má memoria, em que rapazes de 20 anos feitos homens á força, foram forçadamente armados em guerrilheiros, marcaram profundamente, tanto na alma como no espírito e, deixaram intimamente enraizados em todos um elevado sentimento de lealdade e amizade. Sentimentos estes que todos aqueles que tiveram a felicidade de não passar por essa lamentável tormenta, têm enorme dificuldade em compreender.
Para recordar esse tão importante acontecimento de há três anos, reproduzo as imagens do bolo de aniversário e também do grupo de 27 Carolas aqui reunidos e, já agora uma imagem actual da nossa tão conhecida e simbólica igreja de Nambuangongo.
Quem a viu! e a quem a vê! Não parece. Mas realmente por muito estranho que pareça este é o estado actual da emblemática igreja.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Confraternização da C. Caç.3386 “Os Carolas Unidos”




No dia 8 de Maio vamos realizar o 2º almoço de confraternização, digo o 2º, pois o 1º foi há três anos em 2007, juntamente com os escorpiões da C.Caç 3387 organizados pelo incansável cabo padeiro Mário Silva.
Esporadicamente alguns, poucos, camaradas têm-se reunido juntamente com a CCS.
Espero que de agora em diante tenhamos o nosso convívio com dignidade e anualmente junto da CCS e do Pel. Morteiros.
Estes nossos camaradas do Pel. Morteiros acompanharam-nos em Nambuangongo, sofrendo um morto e um ferido grave quando do feroz e faídico ataque desencadeado pela FNLA em 10 de Setembro de 1972.
O programa tem inicio ás 10. 30 Horas, com concentração junto ao restaurante “ o telheiro”, situado na E.N. nº 1 em Malaposta do Carqueijo na Mealhada, onde o almoço será servido a partir das 13 00 Horas e será antecedido de 1 minuto de silencio em memoria dos nossos camaradas falecidos.
O preço por adulto será de 27,50 euros, as crianças dos 5 aos 10 anos pagam 13.50 euros e os menores de 5 anos não pagam.
A organização estará a cargo dos camaradas Antunes, Duarte, Jaime, Martins e Cruz, pela parte da CCS e Manuel Aldeias pela parte da C.Caç. 3386.



quinta-feira, 8 de abril de 2010

Os eternos esquecidos

Homenagem aos ex-militares da Trafaria

Um grupo de ex-combatentes Trafarienses liderados pelo ex-fur. mil. Pinheiro, ao cabo de um longo e importante trabalho de pesquisa, lançou o livro intitulado” Os eternos esquecidos”.
Antes de mais convêm recordar que a vila da Trafaria fica localizada na margem esquerda do rio Tejo já muito perto da sua foz, é uma antiga vila piscatória do concelho de Almada, situada bem junto das famosas praias da Caparica.
Ao longo das 175 páginas deste documento agora editado e depois de um pequeno resumo histórico sobre as origens desta povoação, podemos vislumbrar a ficha técnica de cada um dos Trafarienses mobilizados para o ex-ultramar português (Angola, Moçambique, Guiné, Cabo-verde, São Tome e Príncipe, Timor, Índia e Macau).
Neste livro cada ex-militar tem direito a uma pagina completa, onde se encontram registados os dados pessoais e militares mais relevantes de cada um deles.
A todos aqueles que se empenharam na construção deste documento histórico, o meu bem-haja pela preservação da memoria dos ex-combatentes

terça-feira, 6 de abril de 2010

Cinema em tempo de Guerra

Durante os longos períodos em que permaneci no isolamento dos aquartelamentos das nossas tropas espalhados pelo vasto sertão Angolano, não tive oportunidade de assistir a qualquer sessão de cinema.
Regra apenas quebrada, durante a tenebrosa e de má memória Operação Canacassala. Na altura e como relato em: http://www.prof2000.pt/users/secjeste/CCac3387/Canacassala.htm
encontrávamo-nos acampados em tendas de campanha em plena mata dos Dembos, no coração da guerrilha do norte de Angola, e tivemos oportunidade de assistir gratuitamente ao clássico do cinema western, o filme Rio Bravo, realizado e produzido por Howard Hawks em 1959, e protagonizado pelos inesquecíveis: John Wayne, Dean Martin e Ricky Nelson.
Tendo este filme sido projectado para um ecrã formado por um lençol esticado entre dois veículos hunimogues.
Já durante os períodos de aproximadamente duas semanas em que descansávamos na nossa base situada no Campo Militar do Grafanil nos arredores de Luanda, alem das idas á praia da Corimba para a qual tínhamos diariamente transporte militar, assim como para a noite Luandense. Também aproveitava este período de descanso operacional para me deslocar ao cinema, como é o caso do Cinema Restauração, na época 28 escudos dava direito a um ingresso na matiné, a partir do 1º Balcão.
No Grafanil também existia um cinema ao ar livre, com o pomposo nome de "Auditório-Cine", que exibia  sessões aos fins-de-semana e com entradas substancialmente mais baratas, que eu também frequentava assiduamente.
Desses tempos guardo até hoje os três bilhetes que aqui reproduzo.

sábado, 3 de abril de 2010

Madrinhas de Guerra

Também eu tive a minha madrinha de guerra que me ajudou imenso a ultrapassar os longos e angustiantes dias de trevas, longe dos familiares e amigos enquanto amargurava nas tenebrosas matas Angolanas.

Residia na região de Aveiro, mais propriamente na terra natal do cabo escritas Martinho esta minha madrinha e frequentava o magistério primário, futura professora como a sua irmã um pouco mais velha.


Redigia-lhe extensos aerogramas, chegando a dirigir-lhe quatro e cinco consecutivos, enumerando a sequencia no canto superior direito, ela correspondia-me de igual modo com extensas cartas, ou com vários aerogramas de cor amarela que na metrópole tinham um custo unitário de vinte centavos e estavam isentos de franquia.


Logo pelo Natal de 1972, o primeiro que passei em Angola, enviou-me como Menino Jesus o interessante livro da autoria da premio Nobel Norte Americana Pearl S. Buck intitulado “A Serpente Vermelha”, este excelente livro que eu li com sofreguidão e ainda hoje guardo com carinho, trazia na contra capa uma dedicatória da minha madrinha de guerra, que muito me sensibilizou e que eu aqui reproduzo.


Felicidade Maria onde quer que estejas aceita o meu sincero pedido de perdão, pelo brusco e lamentável corte no nosso relacionamento de escrita, sem aviso prévio e sem de ti me despedir. Atribuo este meu deplorável acto de interromper a nossa amizade virtual ao estado de euforia que de mim se apoderou com o tão ansiado regresso a casa.


No entanto estou-te extremamente grato pelo importantíssimo papel que demonstraste com o teu carinho, palavras de conforto e de estímulo, com que sempre me presenteaste e que tão importantes foram naquela pavorosa odisseia, que foi a interminável e longa noite da guerra em Angola.


Só aqueles que sentiram o coração bater aceleradamente com a chegada do apetecido e ambicionado correio, poderão conceder o justo valor ao importantíssimo papel de uma madrinha de guerra.


Não foi o meu caso, mas no entanto convém recordar que a criação das madrinhas de guerra foi uma iniciativa do (MNF) Movimento Nacional Feminino, fazendo parte de uma estratégia de apoio moral e social aos jovens soldados que combatiam nas ex-colónias, para o efeito publicava-se em algumas revistas, pedidos ás jovens raparigas Portuguesas para participarem neste acto patriótico com o seguinte texto;


"Que cada uma de nós se lembre que lá longe, nas províncias ultramarinas, há rapazes que deixaram tudo: mulheres, filhos, mães, noivas e o seu trabalho, o seu interesse, tudo enfim, para cumprirem o seu dever de soldados. É preciso que as mulheres portuguesas se compenetrem da sua missão, e assim como eles estão cumprindo o seu dever, lutando pela nossa querida Pátria, também vós tendes para cumprir o vosso, lutando pelo bem-estar dos nossos soldados, luta essa bem pequenina, pois uma só palavra, um pouco de conforto moral basta para levar alguma felicidade aos que estão contribuindo para a defesa da integridade do nosso Portugal.


OFEREÇAM-SE PARA MADRINHAS DE GUERRA. MANDEM O VOSSO NOME E A VOSSA MORADA PARA A SEDE DO MOVIMENTO NACIONAL FEMININO".


("Madrinhas de guerra". Revista Presença. Nº 1, 1963, p. 36-37).